São
Cirilo de Alexandria, bispo e doutor da Igreja (séc. V)
Sermão 9 na Transfiguração
do Senhor
“Falavam
da morte que Jesus consumaria em Jerusalém”
Jesus subiu à montanha com
seus três discípulos preferidos. Ali se transfigurou em um resplendor tão
maravilhoso e divino, que suas vestes pareciam feitas de luz. A eles apareceram
também Moisés e Elias conversando com Jesus: falavam de sua morte que se
consumaria em Jerusalém, ou seja, do mistério daquela salvação que iria
realiza-se mediante seu corpo; daquela paixão, repito que haveria de
consumar-se na cruz. Pois a verdade é que a lei de Moisés e os vaticínios dos
santos profetas preanunciaram o mistério de Cristo: as tábuas da lei o
descreviam como que em imagem e de forma velada; os profetas, por outro lado, o
pregaram em distintas ocasiões e de muitas maneiras, dizendo que no momento
oportuno apareceria na forma humana e aceitaria morrer na cruz pela salvação e
pela vida de todos.
E o fato de que ali
estivessem presentes Moisés e Elias conversando com Jesus, queria indicar que a
lei e os profetas são como dois aliados de Nosso Senhor Jesus Cristo,
apresentado por eles como Deus através das coisas que haviam preanunciado e
sobre as quais existia concordância entre si. De fato, os vaticínios dos
profetas não discordam da lei: e a meu modo de ver, disto falavam Moisés e
Elias, o maior dos profetas.
Tendo-se manifestado, não se
mantiveram em silêncio, mas falavam da glória que o próprio Jesus iria consumar
em Jerusalém, a saber: da paixão e da cruz, e nelas, vislumbravam também a
ressurreição. O bem-aventurado Pedro, talvez pensando que tinha chegado o tempo
do reinado de Deus, de bom grado ficaria vivendo na montanha; de fato, e sem
saber o que dizia, propõe que se ergam três tendas. Porém, ainda não tinha
chegado o fim dos tempos, nem na vida presente entrarão os santos a participar
da esperança a eles prometida. Disse, de fato, Paulo: Ele transformará nossa humilde condição, conforme o modelo de sua
condição gloriosa, ou seja, da condição gloriosa de Cristo.
Contudo, estando estes
planos apenas começados, e não tendo ainda chegado ao seu ápice, seria uma
incoerência que Cristo – que por amor tinha vindo ao mundo – abandonasse o
projeto de padecer voluntariamente por ele. Conservou, pois, aquela natureza material,
com a qual padeceu a morte segundo a carne, e apagou-a por sua ressurreição
dentre os mortos.
De outra forma, e à margem
desde admirável e arcano espetáculo da glória de Cristo, ocorreu também outro
fato útil e necessário para consolidar a fé em Cristo, não só a dos discípulos,
mas também a nossa. Lá, no alto, realmente ressoou a voz do Pai que dizia: Este é meu Filho amado, Escutai-o.
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