REFLEXÃO SOBRE O CELIBATO A PARTIR DE Mt 19,
12
“Pois há homens incapazes para o casamento porque assim
nasceram do ventre da mãe; há outros que assim foram feitos pelos homens, e
há aqueles que assim se fizeram por amor do reino dos céus. Quem puder entender,
que entenda”.
Este versículo nos coloca dentro da dimensão da vocação,
especialmente neste mês de agosto em que a Igreja em nosso país reflete sobre
os vários tipos de vocações. Para abraçar uma vocação é preciso ter a
consciência que ganharemos, mas que também perderemos. Neste pequeno
texto Jesus nos aponta a adesão ao celibato como uma resposta de amor ao Reino
dos Deus. Para muitos é uma perda abraça-lo, para
outros é abraçar uma grande riqueza que a Igreja conserva. Na sociedade
hodierna parece algo banal, para aqueles que defendem o casamento dos padres
parece somente uma regra disciplinar ou um peso que a Igreja colocou para quem
abraça essa vocação, no entanto para aqueles
que querem configurar-se a Cristo é algo muito profundo.
Em Mt 19, 29 Jesus diz:
“E todo
aquele que deixar casa, ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou filhos, ou
campos por amor de meu nome, receberá cem vezes mais e possuirá a vida eterna.” Aqui Jesus
ainda é mais enfático ao dizer que aqueles que deixam a oportunidade de constituir
uma família por amor ao seu nome receberá cem vezes mais e possuirá a vida
eterna. E isso se cumpre nas nossas missões e nas nossas pastorais. São os
carinhos que Deus, no decorrer da nossa jornada, vai demonstrando para cada um
de nós através de pessoas simples que torcem por nós e rezam para que sejamos
bons padres, padres felizes que em simples gestos demonstram o amor de Deus.
O convite do Nosso Senhor, quando nos chamou e nos escolheu, não foi
somente para partir, mas para sermos discípulos, isto é, partir atrás, seguir
por um caminho que Ele mesmo vai traçar. Isso pode indicar profunda imaturidade,
mas também uma grande liberdade interior. A
tentação sempre estará presente em nossa caminhada,
porém se temos liberdade interior, aquela liberdade de fazer tudo aquilo que
está de acordo com o chamado de Deus, venceremos as tentações e se caímos nelas
teremos forças para recomeçar.
O Papa Paulo VI na sua encíclica sobre o Celibato
Sacerdotal nos aponta três sentidos profundos a respeito do celibato:
O primeiro sentido é o cristológico. Aqui alguns colocam
objeções ao dizer que São Pedro, o primeiro papa, era casado e o próprio Jesus
o chamou. A Igreja responde que o primeiro modelo para os seminaristas e padres
não é um apóstolo e etc, mas o próprio Cristo. Neste primeiro sentido algumas
perguntas devem mexer conosco: Será que temos consciência que estamos imitando
Cristo? Será que queremos imitar Cristo não somente na vivência do celibato,
mas em todos os seus atos? Por que podemos muito bem abraçar o celibato como
Cristo, mas sermos padres rancorosos, padres que tratam as pessoas com
indiferença e não é isso que Cristo quer. Cristo nos quer por inteiro, quer que
vivenciemos aquilo que abraçamos com amor e não forçadamente.
O segundo sentido é o eclesiológico. Imitando Cristo nos
entregamos também à Igreja. A Igreja precisa de nós por inteiro, precisa de nós
por inteiro para chegar a mais pessoas e levar o seu esposo: Cristo. Alguns
questionamentos surgem também aqui: será que queremos realmente o bem da Igreja
ou queremos nos aproveitar dela? Será que temos a coragem de defendê-la em
todas as situações ou somos os primeiros a jogar pedras?
O terceiro e
último sentido é o escatológico, que é fundamental. Numa passagem da Escritura
Cristo diz que no céu ninguém se casa nem se dá em casamento. Então, vivendo o
celibato o sacerdote antecipa o céu aqui na terra. No ano sacerdotal, um padre
da Eslováquia fez uma pergunta para o Santo Padre Bento XVI e disse que mesmo
com as dificuldades naturais, o celibato lhe parecia óbvio ao olhar para
Cristo, mas que se sentia transtornado ao ler tantas críticas mundanas a
respeito deste dom. E o santo padre lhe respondeu: “é verdade que para o mundo agnóstico, o mundo no qual Deus não tem
lugar, o celibato é um grande escândalo, porque mostra precisamente que Deus é
considerado e vivido como realidade”. Que resposta belíssima! Mas será que
valorizamos realmente este dom e temos a consciência que vivenciando-o estamos
mostrando para o mundo que Deus é considerado e vivido como realidade?
Entregar a direção da nossa vida a um outro alguém para traçar
um caminho onde não conhecemos o percurso e as vicissitudes que ele nos
apresenta não é fácil, mas tenhamos a certeza que a promessa que Nosso
Senhor fez e faz se cumpre na nossa vida: receberemos cem vezes mais e
possuiremos a vida eterna e ainda mais: anteciparemos o céu aqui na terra.
Neste sentido o celibato não é
obrigação, mas algo que deve
ser abraçado como dom e vivenciado com amor.
O Beato Charles de Foucauld dizia que “o amor é inseparável da imitação. Quem ama quer
imitar: é o segredo da minha vida”.
Imitemos Cristo não só em palavras, mas com a nossa vida abraçando com amor e
doação o que Ele abraçou.
Que a Virgem Maria nos ajude a imitar o seu Filho e nos ajude a
responder os seguintes questionamentos: e eu, o que perdi por Jesus, o que
deixei realmente por Ele? Tenho a coragem de deixar muitas coisas que
atrapalham minha caminhada e de deixar-me por Ele? Quero assumir livremente o
celibato para me dedicar às coisas do Pai e do seu Reino?
Por Sem. Jorge Frances
4º Ano de Teologia
Diocese de Estância/SE